Fadiga emocional chega com força ao agro

Edição XXIX | 03 - Mai . 2025
   Esse é um assunto recorrente demandado nas minhas palestras e mentorias executivas. Talvez porque poucas vezes o agronegócio tenha experimentado momentos em que a gestão de complexidades tenha sido tão evidente quanto agora. E, diante da guerra tarifária e dos conflitos, não há sinais de que isso vá melhorar em breve.

   As complexidades não se limitam a entender o comportamento do clima, das pessoas, dos mercados, das redes ou dos seus negócios. É sobre tomar decisões em ambientes pouco previsíveis, com margens estreitas e consequências amplas. É nesse cenário que está a figura central: o dono, ou empresário (embora muitos não se vejam assim).

   Tenho percebido, cada vez com mais frequência, que muitos estão começando a ceder emocionalmente. Claro que, na maioria dos casos, eles próprios não reconheçam isso, dando conta de que nessa complexidade a ser gerenciada, falta exatamente o principal: gerenciar a si mesmo.

   Há gente boa quebrando e, muitas vezes, não é por incompetência técnica. São evidentes os sinais de esgotamento, principalmente esgotamento de decisão, de incerteza e de expectativa. São anos navegando num ambiente que muitas vezes não oferece descanso e que, com frequência, se assemelha a uma montanha russa, com altas variações de tensão.

   Falar sobre isso não é fraqueza, é estratégia
   Boa parte dos empresários (e empresárias, obviamente) do agro foram forjados para ignorar, resistir e avançar. Muitos viram os pais e até os avós seguirem o modelo. Aprenderam a aguentar calados, a engolir a pressão e encontrar as alternativas que fizeram do agro brasileiro um exemplo e o principal player mundial. Mas os tempos eram outros, as pressões eram diferentes, e a velocidade das mudanças também.

   Liderar sem estar bem emocionalmente não é liderança, é sobrevivência. E ninguém constrói estratégia, amplia mercado ou forma sucessor apenas sobrevivendo. Talvez seja a hora de parar de tratar a gestão emocional como um luxo e começar a enxergá-la como parte do modelo de negócio também no agro. Outros setores já assimilaram isso.
Não se trata aqui de vitimismo ou leniência. Se trata de proteger o ativo mais estratégico da organização: você, o dono e sua família. Aquele que pensa, decide, lidera e
principalmente arrisca. Quando você trava, todo o sistema trava junto. Talvez um sistema centenário que muitas vezes veio de gerações esteja em suas mãos agora.

   Clareza e as decisões do nosso cérebro
   Empresários que operam em cadeias agroindustriais complexas precisam lidar com variáveis que vão da base de produção, passam pelo comportamento do consumidor urbano até o cenário geopolítico internacional. É análise, influência e pressão por todos os lados diariamente. E, nesse ambiente, até líderes mais preparados começam a perder algo precioso: clareza.

   A falta de clareza poucas vezes vem da falta de dados. Normalmente vem de excesso de tensão. De não ter mais margem emocional para analisar, ponderar e decidir. A fadiga emocional vai tirando a nitidez, e as decisões deixam de serem racionais e se tornam emocionais ou de sobrevivência.

   Ao invés de utilizarmos o córtex pré-frontal (CPF), que é o nosso cérebro racional, utilizamos o sistema límbico, que regula as emoções, ou o tronco encefálico, nosso cérebro mais primitivo, treinado para sobrevivência e que adota duas decisões em essência: luta ou fuga. E nesse momento, o empresário deixa de ser protagonista e passa a ser apenas reativo.

   Como aliviar a pressão
   Aqui não cabe receita. Mas há práticas objetivas que integradas ajudam a aliviar a pressão e manter o equilíbrio mesmo quando o ambiente ao redor parece ceder.

• Autoconhecimento: Invista nisso antes de tudo. Preste atenção em você mesmo. Qualquer mudança apenas inicia pela consciência, e isso requer autoconhecimento. Você pode iniciar reservando momentos para refletir sobre as emoções e identificar gatilhos de estresse. Não seja prepotente, seja inteligente.
• Apoio profissional: Contar com a orientação de um mentor ou mesmo de profissional especializado em gestão emocional é fundamental. Há ferramentas e técnicas específicas para o seu contexto e, garanto, aliviam muito. Já estive dos dois lados da mesa.
• Defina prioridades: Estabeleça metas claras e realistas das atividades. Não deixe o dia-dia engolir seu planejamento. Isso ajuda a focar no que é realmente importante e a evitar sobrecarga ou ruminação emocional.
• Delegue tarefas: Validar a confiança ou desconfiança na sua equipe é fundamental, e isso só ocorre quando você delega de fato. Isso não apenas reduz sua carga de trabalho, mas também empodera os colaboradores e agiliza suas decisões estratégicas. Além de saber de uma vez por todas com quem você pode contar e quem precisa tirar do jogo.
• Rotina e limites: Rotina é o grande diferencial de sucesso. Quem não tem, está sempre sendo gerenciado pelas demandas dos outros, embora muitos achem exatamente o contrário. Defina horários para o trabalho e para o lazer. Respeitar esses limites é essencial para evitar o seu esgotamento e dos que estão na sua volta.
• Mindfulness: A técnica de atenção plena foi uma das que mais me ajudaram em momentos de ansiedade e estresse. Manter o foco no presente, nos fatos e no que está no nosso controle, reduzindo a ansiedade em relação ao futuro incerto, é uma chave valiosa.
• Atividade física regular: É fundamental manter-se em movimento. Por isso, exercícios físicos são comprovadamente eficazes na redução do estresse e na melhoria do humor. Não abra mão disso nunca. Se não tiver o hábito, coloque com urgência na sua rotina.
• Rede de apoio: Já escrevi aqui sobre o fato de que ser empresário e líder é uma tarefa solitária. Por isso, mantenha-se em contato com outros empresários do setor, estabeleça conexões genuínas e mantenha a relação familiar saudável. Isso requer intenção e esforço, mas os resultados virão. Compartilhar experiências, desafios e sentimentos aliviam a pressão e podem proporcionar novas perspectivas e soluções.

   Por fim, o empresário precisa se olhar no espelho com mais honestidade e menos cobrança. Precisa se autorizar a pausar, a recalibrar e a se cuidar. Porque a máquina que ele comanda precisa funcionar. Mas ela não vai longe se o motor principal estiver falhando.

   Até a próxima.
Compartilhar